
Há na política sempre
elemento cultural e histórico que regionaliza as práticas de poder. A
especificidade da Direita brasileira está – sem dúvida – no tardio
estabelecimento do contraponto político advindo do proletariado moderno e do
jacobinismo igualitário que no choque político proporcionou – nas nações
avançadas – o equilíbrio importante para o nascimento das democracias liberais modernas.
Aqui – por exclusão da maioria da população do campo político – a democracia
por um longo tempo sempre foi um simulacro de modernidade. O Brasil nasce em
1822 no calor da dupla revolução, mas independentemente das forças
revolucionárias modernas o pensamento político dominante no país foi o de
adaptação elitista do moderno às estruturas de poder tradicional. Não há povo
como realidade política. Assim, a latifúndio e a escravidão mantiveram-se como
fenômeno que indicia o elitismo brasileiro impregnado nas instituições e que marca
a desigualdade como o imenso atraso do Brasil. Ainda hoje a escravidão e o
latifúndio estão, sob o véu da modernidade, presentes na matriz das
desigualdades de toda a ordem no país [trabalho doméstico sem garantias
modernas, trabalho infantil, trabalho escravo não são meros acidentes]. Dessa
forma, no discurso político da Direita brasileira não há qualquer oposição
entre desigualdade social e modernidade econômica. Há
no imaginário político da Direita o medo da alteração da ordem social
engendrada pelo mercado e que naturalmente empurra os indivíduos para a
prosperidade. A Direita brasileira pontua seu imaginário na naturalização das
desigualdades no país. Como os pobres no Brasil estão ainda ligados aos
desdobramentos do escravismo a saída ideológica consiste em negar qualquer
reparação histórica. Efetivamente, o fim do escravismo foi muito mais ato de
eliminação da vergonha das elites nacionais frente às nações liberais modernas
do que política ética de emancipação e integração dos afro-brasileiros. Na
caixa de pandora das elites políticas está o preconceito e a visão negativa
frente às massas empobrecidas.
O Brasil é atrasado – segundo a Direita
brasileira – por preguiça e falta de inteligência do povo. Ideia que está
entrelaçada ao racismo nacional, pois a imagem do povo é a do negro ou mestiço.
No imaginário do gigante há direta e indiretamente o racismo, que, além de
preconceito, reproduz a dominação política sorrateiramente. Como o povo
brasileiro, por longo período da história do país, assistiu aos desdobramentos
da política nacional diante da porta de um teatro do qual não era permitida a
sua entrada, o imaginário político de Direita não o reconhece como ator
político independente. É possível sempre – nesse raciocínio – manipular os
eleitores pobres, mas as Elites nunca. Os pobres são percebidos como corpos de
baixa cidadania e deslocados de liberdade efetiva. Não tem liberdade, pois
desejam calorosamente a servidão. É a velha imagem de dominação escravocrata
que permeia em resíduo importante na política brasileira. Nessa perspectiva, a política
imaginada pela Direita brasileira encontra-se na modernização conservadora.
Modernizar as estruturas produtivas sem abrir mão da conservação das estruturas
de desigualdade social. O Brasil deve persistir moderno e desigual. As formas
de dominação conservam a tradição escravocrata. Logo, a distância e a
assimetria abissal entre pobres e ricos é a regra geral. O pensamento de Direita
não se encontra restritivo à elite bem-nascida, pois está disseminado nas
instituições e no próprio imaginário político na forma de cultura autoritária.
Nossa tradição política dorme na consciência do gigante que acorda sempre quando
se sente ameaçado pela transformação social.
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