sábado, 22 de junho de 2013

Por uma História Imediata da Ubiquidade dos Movimentos de Massa no Brasil

   É necessário tornar-se crítico.
                             Paul Virilio

 O grande silêncio das coisas muda-se no seu contrário através da mídia.
                                                                      Michel de Certeau

Pela primeira vez no Brasil movimentos de massa em tempo real, deslocados de território e organização política inflacionam o coração das cidades numa explosão de subjetividades instrumentalizadas apressadamente pela mídia conservadora. Afinal, na contemporaneidade, é no telejornal das  8 horas que a política se joga. As "redes sociais" apenas verberaram a agenda cuidadosamente organizada em imagens e discursos ordinários que pela persistência se transformaram em "live politics".  Trata-se de real criado e dito indeterminadamente a fim de fabricar aquilo que se deve crer e fazer. Como dizia Michel de Certeau: "a fabricação de simulacros [midiáticos] fornece assim o meio de produzir crentes e portanto praticantes". Trata-se de política em tempo real em que a manifestação é articulada à representação midiática tornando-se mera imagem publicitária. Portanto, estamos diante de acontecimento inédito na história do país no qual há diminuta reflexão e meio político frágil para  uma resposta democrática. 
 O que começou como parte de uma revolução molecular desencadeada por anarquistas hipermodernos que criativamente transformaram em política a questão do transporte público fazendo da mobilidade, do deslocamento nas cidades um "Direito de Cidadania" desaguou numa contra-revolução molecular de coloração neoconservadora acelerada pelo discurso insuflante da mídia. Os jovens do "Movimento Pelo Passe Livre" apenas - acidentalmente - abriram a "caixa de pandora" onde toda a subjetividade autoritária brasileira estava guardada. Nossa estética cordial ignora a violência política cotidiana presente na cultura dominante que se sente violentada mesmo pela presença, em esboço, de um Estado que desenvolve políticas públicas para as camadas mais pobres do país. As corporações midiáticas são responsáveis pela ubiquidade do tom autoritário presente em nossa cultura política. O movimento não teria o estrondo intimidador que teve sem o agenciamento midiático. Em tempos informacionais as mídias correspondem ao poder destruidor das bombas modernas fazendo pó fortalezas políticas então imaginadas seguras, visto que tendem rapidamente em fabricar o real com aparências. 

domingo, 16 de junho de 2013

A Ambivalência do Engajamento Transpolítico na Modernidade Líquida

Sempre é importante para a reflexão-crítica pensar a partir da paisagem social e política no quadro da temporalidade de nosso mundo. Assim, para tecer palavras sobre os movimentos de jovens que marcam um "novo modo de produção de engajamento" é - fundamental - contextualizar a paisagem. Trata-se de jovens constituídos em "modernidade líquida", onde os laços são sempre frágeis e a insegurança é a regra geral. Nessa paisagem o mercado é total, totalizante e totalitário com espaços diminutos para a cidadania, pois há a espetacularização da vida e a concentração do social  nas telas publicitárias. Dessa forma, a ambivalência do engajamento está , por um lado, na crescente necessidade moderna de manifestação política e, por outro, na  realização da ação como ato frágil e solitário. 
O que os diferencia dos "jovens de Maio de 68" ?  Efetivamente, os jovens em acelerada modernidade líquida atuam sobre uma cultura política esbatida pela publicidade, não há um grau intenso de politização, a crítica traduz parte do discurso conservador midiático  [discurso contra a corrupção e postura anti-partidária]e fragmentos de radicalismo social. E a participação é muito próxima da ideia de correr numa "maratona", ou seja, estar ali correndo sozinho na massa é o suficiente. O hiperindividualismo moderno carrega consigo o "transpolítico" - algo que tangencia a política sem produzir efeitos transformadores. Do contrário - Maio de 68 - produziu uma expansão da dimensão política [liberdade do corpo como ato de rebeldia frente à "Sociedade Disciplinar"] articulada à Filosofia Política Crítica de Marcuse e Sartre e a participação no campo da representação social e política. Não eram indivíduos insatisfeitos, mas grupos sociais juvenis desejando revolução.
De fato, a ambivalência presente no engajamento desses jovens corresponde à perversidade de nossa paisagem. Em tempo esgotado de cidadania, em que o mercado é tudo [até mesmo política], sobra muito pouco espaço para a transformação. 

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Movimentos de Massa e o Esbatimento do Político na Pós-Modernidade

Pululam por todo o globo movimentos de massa protagonizados - essencialmente - por jovens. É fundamental acentuar o termo "massa" para que possamos compreender parte do fenômeno. A massa, de acordo com Baudrillard, não tem nada   a ver com alguma população real, com algum corpo social. Trata-se fundamentalmente de indivíduos isolados do social e da política; indivíduos conectados por redes informacionais [obscenamente nominadas de "redes sociais"]. Ao contrário dos movimentos sociais  em que toda a direção da ação está carregada de debate e planejamento, os movimentos de massa pós-modernos caracterizam-se pela esquizofrenia da práxis e pela ausência de corpo político. 
Diferentemente da fraseologia jornalística embriagada pela violência ao patrimônio, há uma violência simbólica muito mais grave presente nos movimentos de massa pós-modernos que precisa ser contabilizada. Em poucas palavras, a violência simbólica - presente  nestes movimentos - corresponde à transformação das forças vivas em hiperindividualismo moderno que fomenta a cultura de massa em detrimento do social e do político produzindo, assim, o esbatimento da representação política. De fato, não há utopia - como em Maio de 68 - apenas a explosão de subjetividades. 

domingo, 9 de junho de 2013

Os Estados Unidos no limite da Hipermodernidade

Como dizia Jean Baudrillard: "a convicção idílica dos americanos de que são o centro do mundo, a potência suprema e o modelo absoluto não é falsa". De fato, os americanos são a vanguarda da modernidade, o modelo que arrasta a todos para um mesmo triturador sócio-cultural. Não se trata apenas de poder econômico, militar e político - o que é evidente depois da bipolaridade - mas de algo maior, de simulacros de utopia realizada. Nos Estados Unidos a utopia moderna de liberdade e justiça perece tão real para eles como os filmes hollywoodianos são para os espectadores-mundo. Assim, somente os americanos podem definir os conceitos revolucionários da própria modernidade; liberdade e justiça são conceitos com efeitos mais verdadeiros quando pronunciados pelo poder político e publicitário americano. 
Os Estados Unidos no limite da hipermodernidade representam antes um poder espectral do que real, de certa forma a centralização do cinema americano como filmografia-mundo, assim como seu  jornalismo que centraliza a informação-mundo corroboram a presença de poder ideológico inédito de tom totalitário. Efetivamente, nunca a expressão de "fim da história" - pelo menos a história como realização de projeto moderno de matriz hegeliana-  esteve tão próxima de realizar-se,  em distopia, como agora. Se o poder moderno-militar é antes imagem cativante do que realidade destruidora, antes ideologia-imagética do que realidade político-filosófica; então estamos -absolutamente - diante deste poder.

sábado, 1 de junho de 2013

O Esgotamento do Trabalho e a Violência na Hipermodernidade

O "desemprego" e a "violência" são, sem dúvida, os problemas mais  explícitos da hipermodernidade. Há mesmo uma importante relação entre ambos. Na batalha do mercado de trabalho são os jovens que representam as primeiras baixas, do Oriente ao Ocidente, de Norte à Sul o percentual da mão-de-obra juvenil desempregada é sempre estrondoso. São as baixas do Capital em sua fase moderna de acumulação por espoliação, em que a força motriz humana não produz, em massa, valor para a produção capitalista. Em poucas palavras, nosso tempo é de esgotamento do sacrossanto trabalho moderno e a violência presente nos grandes centros urbanos, grosso modo, resulta da falta de perspectiva laboral num mundo moderno em que o "trabalho" ainda representa a própria integridade moral do sujeito. 
A condição de "desempregado" na modernidade sempre representou a marginalização do corpo. Há um desejo forte em nós de servir ao capital, de produzir mais-valia, que marca - ideologicamente - a própria história da exploração capitalista. Entretanto, caminhamos para um mundo em que o capital não necessita das forças vivas do proletariado. De acordo com Viviane Forrester: 

"Vivemos em meio a um engodo magistral, um mundo DESAPARECIDO que teimamos em não reconhecer como tal e que certas políticas artificiais pretendem perpetuar. Milhões de destinos são destruídos, aniquilados por esse anacronismo causado por estratagemas renitentes, destinados a apresentar como imperecível nosso sagrado tabu: o trabalho". 


Nosso contexto é de esgotamento da própria estrutura de dominação capitalista, ou seja, o trabalho moderno. Sem o trabalho, sem a perspectiva de ser explorado, instala-se uma anomalia social.  Efetivamente, pela primeira vez na história moderna as promessas de igualdade, liberdade e fraternidade nunca estiveram no limite político de serem - verdadeiramente - cumpridas, do contrário a violência será a única realidade do mundo.